Como escolher o excipiente das cápsulas

Como escolher o excipiente das cápsulas

As cápsulas correspondem a maior parte das preparações de uma farmácia de manipulação. Para aviá-las é necessário pesar o(s) insumo(s) prescrito(s) e adicionar à fórmula uma quantidade ideal de excipiente, que seja capaz de auxiliar na distribuição homogênea da substância ativa em cada cápsula. Por muito tempo os excipientes foram considerados como um adjuvante de fórmula inerte. Hoje sabemos que não é bem assim. Os excipientes além de auxiliarem na produção da fórmula, podem interferir na liberação e estabilidade do fármaco.

Então, se um excipiente pode interferir na liberação e estabilidade do princípio ativo, isso significa que uma escolha errada pode reduzir o prazo de validade da fórmula ou até mesmo comprometer o resultado do tratamento do paciente. Reunimos aqui algumas dicas para você escolher com consciência o excipiente utilizado na sua farmácia.

Compreendendo a relação solubilidade e permeabilidade

O fármaco presente em uma forma farmacêutica é liberado no fluido gastrointestinal para formar uma solução. Esse processo é limitado pela sua solubilidade. Uma vez que o fármaco se encontra na forma de solução, ele atravessa as membranas das células que revestem o trato gastrointestinal. Esse processo é limitado pela permeabilidade.

Então, só depois que um fármaco passa por esses importantes processos de solubilização e permeação, será absorvido e atingirá a circulação sistêmica. Em outras palavras, a absorção oral e, portanto a biodisponibilidade são determinadas pela extensão da solubilidade e permeabilidade do fármaco.

Um fármaco é considerado de alta solubilidade quando a sua dose posológica mais alta é solúvel em 250 mL de meio aquoso na faixa de pH de 1,0 a 8,0. Uma substância é considerada de alta permeabilidade quando a fração absorvida é 90%. A permeabilidade pode ser determinada através da utilização de modelos in vitro tais como as células Caco-2.

Comece analisando seu insumo

Faça uma pesquisa minuciosa das características dos insumos como solubilidade, incompatibilidades (principalmente com excipientes), se o fármaco é susceptível a oxidação e detalhes se sua biodisponibilidade. Você pode encontrar essas informações em publicações científicas pesquisando as palavras chaves no Pubmed por exemplo. Outro local estratégico para conhecer as características físico-química dos insumos é o site DrugBank.

Enquadre o insumo dentro do Sistema de Classificação Biofarmacêutica (BCS)

A absorção oral e a biodisponibilidade do fármaco são determinadas principalmente pela extensão da sua solubilidade e permeabilidade. Em 1995 Amidon e colaboradores propuseram um sistema de classificação biofarmacêutica (BCS), classificando os fármacos através da sua solubilidade e permeabilidade, conforme tabela abaixo:

CLASSE 1
Alta solubilidade
Alta permeabilidade
CLASSE 2
Baixa solubilidade
Alta permeabilidade
CLASSE 3
Alta solubilidade
Baixa permeabilidade
CLASSE 4
Baixa solubilidade
Baixa permeabilidade

Classe 1 – São os melhores fármacos para escolher excipiente pois eles apresentam alta solubilidade e alta permeação, com isso, não há necessidade de utilizar excipientes que promovam estratégias para melhorar sua absorção. Porém, deve-se ter cuidado para não escolher algum que dificulte a dissolução do fármaco.

Classe 2 – São os fármacos de baixa solubilidade e alta permeabilidade (fármacos lipofílicos). Nesse caso o fator limitante é a dissolução do fármaco devido a baixa solubilidade, portanto, deve-se optar por excipientes que auxiliem nesse processo como diluentes solúveis ou dispersíveis, agente molhante e agente desintegrante.

Classe 3 – São fármacos de alta solubilidade, mas baixa permeabilidade (fármaco hidrofílico). Sendo assim, a absorção é limitada pela baixa permeabilidade do fármaco porém a permeabilidade, em geral, não pode ser alterada pelo uso de excipientes.

Classe 4 – São os fármacos com maiores obstáculos para se trabalhar pois apresentam baixa solubilidade e permeabilidade. Deve-se optar por excipientes que possam promover uma melhor dissolução do fármaco melhorando sua biodisponibilidade.

Onde encontrar o BCS do meu insumo?

O site BCS Database traz uma lista com a classificação de diversos fármacos.

Ainda não encontrei o que faço?

Informações detalhadas de insumos são mais fáceis de ser encontradas para fármacos comercializados pela indústria farmacêutica. A farmácia magistral manipula além desses fármacos, muitos nutracêuticos e fitoterápicos que dificilmente suas características físico-química serão encontradas documentadas em literatura. Além disso, uma cápsula manipulada geralmente apresenta mais de um insumo na mesma cápsula.

Se você não encontrou em artigos científicos e listas confiáveis de classificação BCS, avalie a solubilidade do fármaco e enquadre-o pelo menos com o dado de solubilidade. E, para os casos de fórmulas com diversos insumos e classificações distintas, escolha o excipiente para atender o fármaco presente na fórmula com requisito mais crítico.

Mas como sei qual excipientes escolher?

Quando você tem os dados físico-químicos do insumo e sabe sua classificação biofarmacêutica fica mais fácil selecionar os excipientes ideais. Lembre-se que dentro da classificação o insumo pode ser solúvel ou insolúvel, permeável ou impermeável. Contudo, o uso de excipientes pode auxiliar para aumentar a solubilidade de um insumo mas, de forma geral, não vai interferir em sua permeabilidade.

Então, pensando nos fármacos solúveis que são enquadrados na classe 1 e 3, você deve pensar em excipientes que não prejudique essa solubilidade e dificulte a dissolução. Então para esses casos, não há muito problema na escolha de excipiente, mas a literatura indica o uso de diluentes insolúveis como amido, celulose microcristalina, talco uma vez que esses diluentes auxiliam na desagregação sem interferir na solubilidade do fármaco no meio dissolvente.

Agora se o insumo pertence a classe 2 ou 4 estamos falando de insumos insolúveis e será necessário uma boa micronização e uso de excipientes que auxiliem no aumento da solubilidade. Como diluentes deve-se optar pelos solúveis ou dispersíveis como lactose e manitol. Agentes molhantes como Lauril sulfato de sódio ou Docusato sódico na concentração 0,1 a 1,0% e agentes desintegrantes (ex.: Glicolato de amido sódico, Croscarmelose sódica e amido pre-gelatinizado na concentração de 5 – 20%) também devem ser utilizados no intuído de melhorar a solubilidade do fármaco. A literatura ainda traz que para os insumos classe 4, muitas vezes é necessário serem solubilizados em líquidos anidros e massa semi-sólida para posterior encapsulação.

Mas lembre-se que ainda existe outros adjuvantes que podem melhorar ainda mais seu excipiente. Se a fórmula apresenta insumo susceptível à oxidação, adicione um antioxidante na fórmula como o BHA, BHT, metabissulfito ou ácido ascórbico. Para insumos higroscópicos o ideal é adicionar como excipiente um adjuvante como carbonato de magnésio, dióxido de silício, óxido de magnésio. E, a adição de um agente lubrificante pode auxiliar na redução da adesão entre os pós e os equipemantos utilizados na manipulação (principalmente os metálicos) como estearato de magnésio e talco na concentração de até 2%.

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Bibliografia consultada:

Amidon GL; et al. A Theoretical Basis for a Biopharmaceutic Drug Classification: The Correlation of in Vitro Drug Product Dissolution and in Vivo Bioavailability, Pharm. Res., 1995.

Ferreira AO. Guia prático da farmácia magistral. 2018

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